Hoje, falaremos sobre o azeite, um ingrediente muito querido por amantes do vinho.
Ele já foi utilizado para iluminar caminhos. Um archote embebido de azeite dentro de uma lamparina combatia a escuridão de lugares públicos e residências, entre os romanos. Hoje, seria um pecado fazer tal uso do melhor das azeitonas.
Para os catadores, os "sommeliers do azeite", uma heresia! Afinal, assim ocorreu com o vinho há algumas décadas, o azeite vem conquistando seu espaço gourmet em solo nacional.
O chamado "ouro líquido" está presente não só nas prateleiras dos supermercados, como, nos últimos anos, pode ser encontrado em lojas exclusivas, frequentadas por amantes da boa gastronomia. Nos restaurantes, o leque de opções também é maior. E não foi apenas o hábito do consumidor que mudou. O mercado produtor cresceu e, com ele, a vaiedade de azeite disponível em todo o mundo. Foi este o novo cenário que se viu na segunda edição da Expoazete, feira realizada em São Paulo, no mês de setembro. Segundo a Oliva (Associação Brasileira de Produtores, Importadores e Comerciantes de Azeite de Oliveira), nosso país está entre os dez maiores consumidores do mundo, com vendas anuais de 35 mil toneladas e consumo per capita de 0,4KG/ ano. Em comparação com o dos gregos (25kg/ano), e com o dos espanhóis e italianos (12kg/ano), nosso consumo ainda é modesto. No entanto, o Brasil é considerado um mercado com muito potencial, que registra um crescimento anual de 7%. Segundo Patrícia Lafuente, da Azeite de Oliva Espanhol - um dos principais divulgadores do azeite no mundo - esse aumento reflete o maior poder aquisitivo do brasileiro, o que resulta na melhora dos hábitos alimentares. Se por um lado o consumo está cada vez mais sábio e qualitativo, por outro a produção brasileira ainda está em experiência. Regiões de clima mediterrâneo - como Maria da Fé, em Minas Gerais, e Caçapava do Sul e Pelotas, no Rio Grande do Sul - possuem plantações de oliveiras há algum tempo, mas somente neste ano se extraiu o óleo de suas azeitonas. Enquanto a produção nacional dá seus primeiros passos, os brasileiros consomem importados provenientes do mundo todo. Por razões históricas, Portugal continua no topo da lista, seguido por Espanha, que lidera os rótulos de azeite extravirgem no nosso país.
No espaço cultural
A valorização do azeite em solo nacional é sentida também no sucesso das chamadas boutiques. Em 2002, a La Table O&Co foi a primeira a introduzir no país o conceito de um ambiente misto de restaurante e loja, onde se pode degustar e aprender sobre azeites do mundo todo, de tradicionais mediterrâneos a novos argentinos.
Isaac Azar, catador da boutique e restaurante Azait, também vem sentindo maior interesse por azeites de qualidade. No Azait, a escolha do azeite que complementa a criação do chef é tão importante quanto a eleição do vinho que acompanhará o prato. Da entrada à sobremesa. "Sempre que as possibilidades de combinação de aromas e sabores são bem explicadas e demonstradas, a aceitação é grande", acredita Azar. Os aromáticos - de limão, tangerina ou manjericão, por exemplo - são os preferidos para a sobremesa. O que não quer dizer que não harmonizem bem com uma carne. "Tudo depende da criação do chef."
E foi para propagar a cultura desses dois produtos que a importadora D'olivino entrou há três anos no mercado especializado. Com o conceito de difundir os dois protagonistas da dieta mediterrânea, é um local dedicado exclusivamente ao azeite e ao vinho. A Alimentação voltada à saúde e ao melhor do paladar é seu foco, com influências da gastronomia européia espanhola, portuguesa, italiana e também da grega e marroquina. Em tais culturas, o azeite é base para o preparo de quaisquer pratos, sempre acompanhados do vinho. Para decidir qual o melhor rótulo, é possível degustar e aprender mais sobre o produto com o catador Marco Antônio Guimarães.
Reconhecendo um bom azeite
A difusão do azeite traz também a necessidade de informação. Afinal, ao aumentar a oferta, crescem também as dúvidas na hora de comprar. Elena Vecino, catadora e produtora espanhola, veio à Expoazeite para nos ensinar aquilo que aprendemos há mais de 20 anos com o vinho: ler o rótulo, distinguir aromas e sabores, conhecer as variedades de olivas. Elena lembra que um azeite etravirgem é o "suco de oliva", ou seja, o azeite de primeira prensa, sem qualquer tipo de mistura, com acidez menor do que 0,8%. Os azeites obtidos com a ajuda de solventes na extração ou misturados a outros óleos são os chamados azeites de segunda prensa. Estes podem ser virgens (acidez entre 0,8 e 2%) ou simplesmente azeites (acidez maior do que 2%). Além dessa informação, segundo as normas da União Européia, o rótulo deve trazer o nome da oliva, a região produtora e a data de fabricação do produto. Elena destaca ainda as denominações de origem. Na Europa, duas siglas já são bastante comuns: DOP (Denominação de Origem Protegida) e IGP (Indicação Geográfica Protegida).
Também da Europa vem outro fenômeno que está se tornando mais conhecido por aqui: os clubes de degustação. Em São Paulo, o Azeite Club monta sessões em casa, com a presença de um especialista que ensina técnicas básicas de degustação e fala sobre a origem e a cultura do azeite. Adegustação, acreditam os produtores, é algo essencial, pois, assim como o vinho, o azeite é obtido de diferentes tipos de oliva. Há 300 deles registrados no COI (Conselho Oleícola Internacional), e o terroir, da mesma forma que altera as características da uva, modifica a azeitona e cria novos tipos por mutação. E não são todas as que chegam aos lagares. Boa parte delas são as chamadas azeitonas de mesa, incluindo a preta, que é a oliva em um de seus últimos estágios de maturação.
Se para os enófilos é comum pedir seu Cabernet ou o seu Merlot preferido, para os amantes do azeite os nomes Arbequina e Picual são bem familiares. A similaridade com o vinho também está na forma de produção: há azeites feitos de uma só variedade de oliva - os monovarietais - e os que trazem misturas numa mesma garrafa, os chamados blends.
No entanto, enquanto um vinho pode melhorar e evoluir com a guarda, um om azeite será sempre o mais jovem. A luz, a temperatura e a oxidação diminuem a qualidade do óleo com o tempo e lhe trazem sabor e aroma de ranço. Por isso é importante saber qual o melhor recipiente para armazená-lo. Garrafas de vidro escuro, locais frescos e com pouca luz são os mais indicados. Outra diferença marcante é que, se no vinho pode-se identificar uma média de 52 compostos aromáticos, no azeite - único óleo comercial sem refino, extraído de uma única fruta o número sobe para 105.
Durante a cata, ou degustação, usa-se um recepiente pequeno, opaco e que, ao ser aquecido entre as mãos, libera os aromas.
Num bom azeite, eles podem remeter a folhas e tomates verdes, frutados, ervas, alcachofras e notas frescas em geral. O toque amargo ou picante indica a presença de polifenóis, poderosos antioxidantes e antiinflamatórios.
Marcos Pimentel, catador da La Table O&Co, afirma ainda que os azeites refletem a sua região produtora. Sendo assim, o azeite da Espanha, de características amargas e fortes, lembram um povo guerreiro. Já o proveniente de Portugal tem muito do português extrovertido em sua densidade e sensação aveludada. O marroquino, por sua vez, traz o mistério nos seus múltiplos sentidos. Isaac Azar, da Azai, concorda: "A oliveira é uma árvore que acompanha a história de uma terra e de um povo". História que também acompanha seus consumidores e sa qual, cada vez mais, fazemos parte.
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parabéns pelo blog!